Fórum Paranaense de Religiões de Matriz Africana e Preconceito

Ontem aconteceu o Fórum paranaense de religiões de matriz africana, onde foi discutido o preconceito religioso e as ações afirmativas das religiões afro. Preconceito, que visivelmente tem aumentado de maneira exponencial nos últimos meses que antecedem as eleições.

Acredito que o momento que vivemos é bastante complicado e que precisamos realmente parar e refletir sobre os preconceitos que assolam um país onde o totalitarismo religioso apenas tem avançado e se mostrado forte suficiente para parecer majoritário.

Um dos temas discutidos foi, por exemplo, a postura da vereadora Carla Pimentel que no plenário disse que não via qual a utilidade pública de um “terreiro de macumba”. Ainda se referindo aos parlamentares, da dita bancada religiosa, que aprovaram a medida como “aqueles que se dizem evangélicos”, dizendo que dessa maneira ela era o baluarte dos interesses protestantes da cidade de Curitiba. Como não conheço o caso a fundo não posso entrar no mérito documental de determinado templo, porém posso concluir que qualificar depreciativamente o templo de uma religião de matriz africana é no mínimo preconceituoso, levando-me a desacreditar que ela possa representar tal classe.

O primeiro problema é que enquanto legisladora a mesma senhora não pode ao menos se qualificar como defensora dos interesses de uma categoria, já que não possuímos mais os obscuros legisladores “classistas” e “biônicos” em nosso país. Fator que garante uma democracia mais plena que lute pelo povo, e para o povo, dentro dos limites da nossa constituição.

Ao mencionar a nossa constituição gostaria de citar o artigo III, inciso 4, da mesma que se refere a: “promover o bem de todos sem preconceito de origem, raça, sexo, cor, idade, e quaisquer outras formas de discriminação”, que em consonância com o artigo V defendem que: “é inviolável a liberdade de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida na forma da lei a proteção aos locais de culto e suas liturgias”. Ainda falando em constituição no artigo V inciso 8 “ninguém será privado de direitos por motivo de crenças religiosa, convicção filosófica, ou política. Salvo se as invocar para se eximir de obrigação legal a TODOS imposta e recusar-se a cumprir prestação alternativa fixada em lei”. Pela justificativa anunciada pela vereadora, que foi eleita para ser a representante de TODO O POVO de Curitiba dentro dos limites da constituição, não acredito que seja possível encontrar alguma jurisprudência para o caso, tão pouco que o “terreiro de macumba” deva se eximir de alguma modificação documental, já que optou por se submeter a uma votação na Câmara da cidade. Não restando isenção legal, e tão pouco argumento que justifique tal voto. Gostaria de salientar que enquanto legisladora do POVO de Curitiba a dita vereadora não poderia se considerar membro de uma oligarquia, para não legislar em causa própria. Em resposta tal bancada se ausentou da segunda votação, o que não devo esquecer remete a uma justificativa “plausível e dentro dos princípios da legalidade”.

Ando um pouco cansado de citar a nossa constituição nos textos que escrevo, pois parafraseando o ex-candidato a presidência Eduardo Jorge, realmente estamos precisando de um choque constitucional em nosso país. Visto que ela anda esquecida pelo nosso povo, que tem tomado moral religiosa por Ética cidadã.

Tenho visto que alguns grupos tem esquecido o que é igualdade para se apegar ao interesse próprio, buscando evitar o processo de laicização social iniciado com o Renascimento durante o século XV. Processo que inicialmente negou à Religião o direito de escolher quem era humano (escolhido, filho e por aí vai), ou digno de ter conhecimento, e que por ventura pudesse vir a ter privilégios sociais por conta disso. Mesmas oligarquias que lutaram contra a extinção das diferenças legais quando o povo exigiu e proclamou com a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão que TODOS SÃO IGUAIS PERANTE A LEI. E que ainda hoje dá suas últimas e perigosas investidas contra a naturalização dos Direitos Éticos.

Perigosas, pois na medida em que a lógica da sociedade laica, criada pelos movimentos reformistas, acabou se voltando contra eles mesmos – pregando a verdadeira liberdade social garantida pela Ética desde o movimento Iluminista, e legitimada pela constituição de 1988 – acabou jogando os líderes filosóficos fundamentalistas, dessas oligarquias, em um processo de retorno a uma patrística teocêntrica medieval. Onde as instituições religiosas teriam o direito de crivar o que é “laico” e punir o que não é. Observado pela crescente violência contra todas as minorias do país.

Minorias que ganharam o direito de existir com o mesmo ímpeto que as diferentes religiões europeias a conquistaram por meio da “Paz de Augsburg”, que ainda condicionava a crença de um povo ao seu rei, mas que foi um passo importante pelo direito de ser livre; e de possivelmente se tornar opressor (chega a ser engraçado). Hoje as minorias também lutam pelo direito de ser livre e exercer a sua cidadania, porém precisam vencer mais uma etapa pela naturalização de uma sociedade que sempre foi diversa, mas que não podia se manifestar. Minorias que se reforçam para ao mesmo tempo lutarem contra o preconceito e poderem ser reconhecidas enquanto suas especificidades.

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